A ESCOLA ABANDONADA DE CRIANDE E MORGADE



Criande, junto a Morgade, é uma aldeia barrosã do concelho de Montalegre, “banhada” pelas águas do Alto Rabagão, uma enorme massa de água situada acima dos 800 metros de altitude. Parte do território desta aldeia foi invadido pela construção da barragem, o qual apenas conhece a luz do dia nas alturas em que as cotas baixas da bacia hidrográfica assim o permitem. Foi o caso quando visitei Criande (Dezembro de 2017, altura em que Portugal estava em período de seca extrema).

Atravessei de bicicleta um trilho que normalmente está submerso e dei de frente com um dos principais símbolos da desertificação do interior: a escola primária fechada e condenada ao abandono. Muito diferente das escolas brancas do Planos dos Centenários a que estou habituado, esta tem um aspecto austero, consequência directa das suas paredes escuras construídas com a pedra da região, o granito.


Com a porta escancarada, obviamente, entrei num dos seus edifícios (eram dois) e lá dentro estava o que restava de outros tempos em que a mesma era diariamente frequentada pelos alunos da aldeia de Criande, Morgade e provavelmente dos arredores. No chão muitos papéis abandonados, alguns com datas da década de 70 do século passado.

Entre desenhos e fichas de trabalho dentro de pastas espalhadas pelo chão, havia ainda uma carteira de madeira das antigas, mas sobretudo três janelas que nos permitem observar o território seco da barragem. E que vista aquela com o Alto do Larouco na linha do horizonte, a gravar na minha memória o que todos os meninos e meninas de Criande e Morgade podiam ver do interior da sua sala de aula.


Cá fora no parque de recreio, também ele abandonado, apenas sobravam os brinquedos a apodrecer e o mato a crescer. Tudo junto resulta na imagem mais fiel de como o Estado não é capaz de preservar o seu património e a memória colectiva da sua população. Entenda-se que quando me refiro ao Estado não é necessariamente o governo do país ou as autarquias locais. Na verdade, o Estado somos todos nós que permitimos pela nossa abstenção, omissão, silêncio e imobilidade que estas coisas aconteçam.



Aqueles dois edifícios escolares em Criande já não são úteis à comunidade escolar local a qual, por ser reduzida, vai aprender a ler e escrever para outra paragem. Porém, podiam ser utilizados com outro fim e não me agredia nada a consciência que fossem vendidos e recuperados. Abandonados como estão só servem para má utilização, vandalismo, concentração de bicharada e para curiosos como eu que conseguem encontrar num local abandonado, sentido estético para umas fotografias.

Na verdade, estes locais são depósitos de memórias e de histórias de muita gente que por lá passou. Se fecharmos os olhos por momentos podemos imaginar o reboliço, as conversas e o riso das crianças que ali estudaram. Esse é o lado mais fascinante. Só por isso merecia outro destino.

Nota: Não há nada mais inocente e sincero que a resposta de uma criança. Numa das fichas que encontrei espalhadas pelo chão, prendeu-me a atenção uma pergunta e respetiva resposta:
- Escreve o nome do meio de transporte que tu gostas mais e diz porquê.
Resposta: Eu gosto do autocarro. Porque nunca andei noutro.






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