O meu Caminho de Santiago - Primeira etapa: Chaves a Ourense
Passavam poucos minutos da 8:30 quando iniciei o meu
Caminho. Na primeira etapa tinha previsto despachar metade da distância que me
levaria até Santiago de Compostela. Por ser uma cidade grande e muito bonita
mas também porque era essa a rota do GPS que tinha comigo, defini Ourense como
primeira paragem para pernoitar.
Pela frente tinha essencialmente dois desafios de maior
dificuldade. Um logo após a cidade de Verin e outro mais à frente depois de
Allariz. Estava em causa seguir pelo Caminho Português Interior até Verin e
depois “cruzar” com a Via da Prata cuja origem é Sevilha. Ainda na fase de
planeamento cheguei a ponderar a hipótese de rumar a Laza, após passar em Verin.
Porém tinha vontade de ir a Allariz e isso só seria praticável se seguisse por
Xinzo de Limia. Em termos de dificuldade julgo que seria sensivelmente a mesma.
Optei por seguir pelo caminho mais a sul.
À partida combinei com a família que me acompanhava
encontrarmo-nos hora e meia depois em Verin para obter o carimbo no meu
“passaporte” de peregrino. O percurso até Verin é todo a rolar sem qualquer
dificuldade e dista 30 quilómetros desde Chaves. Por isso consegui chegar oito
minutos mais cedo da hora prevista e ainda tive tempo para parar e tirar umas
fotografias.
Em Verin na Oficina de Turismo recolhi o carimbo de passagem
pelo local e continuei até Albarellos onde percebi que a rota que levava no GPS
não estava em conformidade com as marcações do Caminho. Decidi optar pelas
marcações e esquecer momentaneamente o GPS.
Aproveito para esclarecer que na minha opinião as marcações
não são inequívocas e quando viajamos de bicicleta a atenção deve ser
redobrada, uma vez que existem marcos tapados pela vegetação ou setas
desenhadas em sítios que não estão muito visíveis. Tendo em conta que por vezes
vamos com alguma velocidade é fácil perder uma indicação. Optei por olhar para
o GPS sempre que encontrava um cruzamento ou uma bifurcação e algumas vezes que
não o fiz tive de voltar atrás.
Depois de Albarellos encontrei a povoação de Infesta a qual
não constava do meu GPS e aí começou a primeira dificuldade do dia. Tinha pela
frente uma subida com 9 quilómetros de extensão e uma pendente média de 5%, a
qual começou logo com uma espécie de parede em cotovelo com mais de 10% de inclinação.
Sublinho que esta subida, metade dela é feita num piso de terra batida muito
bom sem pedras soltas o qual me pareceu estar devidamente tratado para
facilitar a ascensão.
A meio desta subida cruzei com a estrada N-525 e um pouco
mais à frente voltei aos trilhos de terra até chegar à povoação de Rebordondo.
Pelas minhas contas estava a meio da subida mas a pior parte estava para
chegar. As inclinações começaram a ser superiores e para agravar a situação o
piso era arenoso e com muita pedra solta. O coração começou a bater a grande
ritmo e a certa altura optei por parar um pouco para baixar o ritmo e enfrentar
o que faltava de subida, bem como para contemplar a paisagem que era fantástica.
Já estava perto dos 840 metros de cota altimétrica onde terminava a subida e
tinha o meu carro de apoio à espera. Retomei a subida nas calmas e pouco depois
cheguei onde tinha de chegar.
Abastecido de água e depois de aumentar o nível da glicémia
fiz-me ao caminho até Xinzo de Limia. Era tempo de descer um pouco para
encontrar um vale com cerca de 23 quilómetros para rolar sem qualquer
dificuldade. E assim foi.
Na parte da manhã tinha cumprido 65 quilómetros por isso
mais de metade da etapa já estava feita. Os primeiros quilómetros tinham sido
rápidos e a subida aos quase 900 metros de altitude tinha servido como primeiro
obstáculo. Sentia-me bem.
Parei em Xinzo de Limia para comer e mais tarde em Allariz,
cidade que recomendo uma visita pela beleza das suas ruas e do seu centro
histórico. Porém antes de chegar a esta cidade tinha feito uma descida num
trilho que percebi tratar-se de uma antiga estrada romana ou medieval ou as
duas coisas, que foi simplesmente fantástica. Adrenalina no estado mais puro.
Não dá para olhar para os lados. Se olhas, cais. Se cais, aleijas-te. Foi
depois da povoação de San Salvador e recomendo a todos os que façam este troço
do Caminho que disfrutem desta descida como eu desfrutei.
Depois de Allariz e a caminho de Turzás voltaria às
dificuldades da etapa. Tinha pela frente uma subida a qual não teria grande
problema se parte dela fosse ciclável. Tratava-se de mais um troço de estrada
muito antiga e com pedregulhos enormes os quais impediam de pedalar. Não tive
outro remédio se não saltar de bicicleta e levá-la pela mão ou às costas.
Daí até à Catedral de Ourense foi um pulo rápido e só não
foi mais porque tratei de me perder nas ruas daquela cidade não só mas também
devido ao muito trânsito automóvel que à imagem do português pouco respeita os
ciclistas.
Passados uns minutos encontrei o caminho para a Catedral
onde fui recolher o último carimbo do dia e reencontrar a família que me
aguardava com uma caña fresquinha a servir de recovery. Infelizmente pelo cansaço que trazia e pela necessidade
de ir para o hotel acabei por não ver com a devida atenção aquele monumento
religioso. Noutra altura quero lá voltar porque se trata de uma catedral de
enorme espectacularidade e beleza.
Esta primeira etapa foi a mais extensa mas das três a mais
fácil. Boa parte dela é feita em asfalto, acredito que tenham sido pelo menos
uns 40%, e em termos de dificuldade só mesmo a subida após Verin faz algum
estrago em betetista menos preparados, como eu. Tudo o resto é relativamente
simples e acessível ainda que uma centena de quilómetros a pedalar em cima de
uma bicicleta já seja uma distância respeitável.
Curiosamente nesta etapa não encontrei um único peregrino no
Caminho, ao contrário do que ia acontecer nas duas etapas seguintes. Depois de
falar com alguns percebi a razão.
Continua.
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