Somos todos gregos?

Está a criar-se um movimento que é sobretudo partilhado e amplificado nos sectores da esquerda política europeia, que assenta na condição que não se pode deixar cair a Grécia, por diversas razões, nomeadamente por tratar-se do berço da democracia.
Quem inventou a democracia merece mais tolerância do que quem tentar cumprir as regras da política monetária europeia do controlo dos défices excessivos e da dívida pública? Não sei. Se calhar não.
A grande verdade é que a Grécia está deitada na cama que fez. Chegou a esta situação dramática porque em primeiro lugar não cumpriu com as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento que subscreveu, bem como por durante algum tempo ter andado a mentir descaradamente sobre o estado das suas contas públicas. E o povo é culpado disto? Também. É o povo que escolhe os seus representantes, os tais que não fazem aquilo que assinam e mentem sobre o estado da economia doméstica.
Como tal, não somos todos gregos, nem queremos ficar gregos.
Em Portugal o que estamos a fazer em termos de esforço colectivo para ultrapassar a situação de eminente bancarrota a que estávamos sujeitos, é doloroso, asfixiante e ninguém em bom rigor sabe dizer com absoluta certeza se será o suficiente e como estará a economia portuguesa depois deste tratamento de choque. Mas a verdade é que estamos a fazer o que nos foi pedido no memorando de entendimento que foi assinado com a troika. A Grécia não pode dizer o mesmo. É verdade que estão um pouco mais à frente que nós em termos de calamidade económica e que não há certezas que o nosso destino não possa ser semelhante ou igual, com tumultos na rua e incapacidade de fazer face aos compromissos e responsabilidades que foram subscritos. Mas estamos a tentar, mesmo com um governo que aparentemente está a ser cozido em lume brando, sabe-se lá até quando, tendo em conta que está a tomar as medidas para resolver problemas herdados.
Por isso, não me parece que tenhamos de enfiar, colectivamente, a cabeça debaixo da areia porque há milhares de anos atrás a Grécia era próspera em neurónios efervescentes que pensaram muito daquilo que hoje somos em temos de organização pública.
A Grécia no Verão de 2004 estava em festa. Sabem porquê? Atenas era anfitriã nos Jogos Olímpicos que como é sabido é o maior evento desportivo do mundo, o qual tem com certeza algum retorno económico indirecto mas implica um esforço financeiro brutal. Não passaram ainda nem oito anos. A festa fez-se, os foguetes foram lançados. Alguém apanhou as canas, mas a factura está aí para ser paga. Passados quatro ano da realização desse evento, muitas das instalações estavam já em estado de abandonado progressivo porque não havia dinheiro para as sustentar. É que para o efeito, o governo grego criou uma entidade para cuidar de todo esse património cujo custo de manutenção anual andava na volta dos 600 milhões de euros por ano.
Sim, qualquer parecença com o nosso Euro 2004 não é pura coincidência. São as tais brincadeiras muito caras feitas em tempo de vacas gordas em que o último a sair fecha a porta. Dão muitos votos na altura mas são uma desgraça à posteriori.
É óbvio que o que acontece hoje na Grécia tem consequências em Portugal. Mas não temos de ser todos gregos para pedir clemência a quem emprestou e agora não recebe.

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