Estadistas e Políticos

Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente do Brasil, definiu e bem a diferença entre um político e um estadista, afirmado que na Europa sobram os primeiros e faltam os segundos.
Segundo Cardoso, estadista é aquele que se preocupa com o Estado, independentemente das consequências, vendo ao longe o que outros não conseguem ver ao perto e tomando medidas sem se preocupar com eleições. Por outro lado, um político é aquele que, podendo estar coberto de boas intenções, decide em função das circunstâncias preocupando-se essencialmente com o impacto eleitoral que as suas decisões podem suscitar.
Isto, numa primeira análise, leva a pensar que não há estadistas em democracia, nem políticos em ditadura. Não deixe de ser um pouco verdade.
Repare-se no caso de Portugal, talvez não seja muito politicamente correcto afirmar, mas é difícil de contrariar, que o único governante que para o bem e para o mal não se preocupou com eleições foi Salazar, o qual, tivesse tido o discernimento suficiente para deixar o povo decidir livremente o seu destino, findo o pesadelo económico em que Portugal estava mergulhado quando ascendeu a Presidente do Conselho e hoje seria recordado em todas as praças deste país com bustos e estátuas de corpo inteiro. O rumo da história não foi este. Não só não percebeu a hora de sair, como mergulhou de cabeça numa guerra estúpida nas colónias ultramarinas, amordaçou as liberdades dos seus cidadãos e perseguiu aqueles que pensavam de modo diferente. Foi de bestial a besta num instante, sendo certo que hoje são muitos os que olham à volta e só vêm pilantragem e sem-vergonhice e ficam com a sensação que isto só se endireita com alguém que não tenha medo de cortar a direito, independentemente das consequências. Ou seja, um estadista como Salazar o foi antes de se tornar ditador.
Porque o que o Portugal democrático nos trouxe foi essencialmente homens e uma mulher políticos. Apenas um, estava no caminho certo daquilo que seria colocar em primeiro lugar e sem hesitações os interesses do Estado, sem estar preocupado com sondagens eleitorais. Mas esse, alguém tratou de o matar de propósito ou por consequência colateral, no interior de uma avioneta despenhada num telhado de Camarate.
Depois de Sá Carneiro, nenhum primeiro-ministro governou sem pensar em eleições e sobretudo em reeleições. Mesmo Cavaco Silva que foi de longe o melhor primeiro-ministro de Portugal e que retirou o país do sentimento albanês em que vivíamos, foi capaz de fazer tudo o que era necessário fazer para nos dar a nós um sentido de decência e de vivência responsável. Tudo o que veio a seguir foi a decadência completa do exercício governativo, com uns que fugiam e outros que mentiam, acrescentando até uma criatura que preferia dormir a sesta do que atender aos compromissos oficiais das suas funções, nos intervalos em que dissertava sobre incubadoras e pontapés no recém-nascido.
O resultado está à vista: um Portugal a soldo refém da ajuda externa, depois de ter desperdiçado oportunidades, umas atrás das outras.
Resta-nos a esperança de acreditar que outro Salazar virá, mas desta vez um que saiba conviver com a democracia e o direito à liberdade, mas que tenha a audácia, a inteligência e sobretudo a seriedade do homem de Santa Comba Dão.

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