A coleira electrónica
A notícia de hoje é que o Duarte Lima vai ficar em prisão
domiciliária até ao julgamento. Eu não sei se concordo com esta medida de
coacção, mesmo para aqueles que ainda são apenas arguidos. Por alguma razão,
mais que não seja a forte suspeita da prática de um crime e perigo de fuga para
o estrangeiro, as pessoas são presas preventivamente. É a mais grave medida a
aplicar numa fase em que ainda não houve julgamento, correndo-se o risco de a
mesma ser injusta.
Mas vamos fazer um suponhamos: imaginar que alguém, que não
tem necessariamente de ser o Duarte Lima, praticou de facto vários crimes,
entre eles burla qualificada, fraude fiscal qualificada e branqueamento de
capitais, por exemplo num caso relacionada com a compra de terrenos em Oeiras
com dinheiros do BPN. Ou seja, há aqui um conjunto de extraordinárias
patifarias que comparadas com os sacrifícios que os portugueses estão a fazer
neste momento em termos de carga fiscal para pagar a nacionalização do BPN que
foi selvaticamente roubado por uns verdadeiros artistas da finança criminosa,
merece medidas de coacção duras, até para persuadir futuros aspirantes a
bandidos de colarinho branco. Bem sei que tratar alguém de modo exemplar pode
significar uma injustiça dentro da justiça.
Porém, e olhando para o caso concreto do Duarte Lima, a
prisão domiciliária representa uma espécie de penitenciária de luxo. É mais ou
menos como escolher entre ficar hospedado na pensão Estrelinha de uma estrela
no Intendente, ou num luxuoso hotel no Dubai. É que a casa do Duarte Lima não é
igual à minha nem à da maioria dos portugueses que hoje, mais uma vez repito
sem querer ser maçador, pagam impostos atrás de impostos para tapar o buraco
provocado pelas roubalheiras no BPN. A casa do arguido Lima é, suponho, um
conjunto de várias paredes que acumulam luxo e mordomias. Numa prisão não há
luxos, nem mordomias.
Para controlar um arguido ou condenado que saía da prisão
antes da pena cumprida, a Justiça coloca uma pulseira electrónica para saber
por onde anda, sobretudo para detectar se ele sai de casa. Mais uma vez
discordo. A pulseira é demasiado discreta e a casa do forte suspeito ou
condenado demasiado privada. Nestes casos e mais uma vez abstraindo-me da pessoa
em causa, a pulseira devia ser uma coleira electrónica bem visível, com luzes
florescentes a piscar. E em vez do forte suspeito ou condenado se ficar pela
privacidade do lar, devia ser obrigado a ir todos os dias à baixa pombalina, ao
Centro Comercial Colombo, percorrer toda a linha do Metro, ir ao estádio nos
dias em que há bola e ao Pingo Doce fazer compras no dia 1 de Maio. Assim sim
estávamos perante uma medida sancionatória e de coacção. É que de outra forma,
a canalha endinheirada deste país fica a pensar que o crime compensa, uma vez
que até lhes é permitido dormir na própria cama, usar a casa de banho privativa
da suite e desfrutar calmamente do plasma na sala sentada num magnífico sofá de
pele genuína, com o comando da televisão numa mão e um flute de Moet &
Chandon na outra. Assim é difícil fazer Justiça. Porque o gajo que roubou um
champô na prateleira do Lidl, não tem estas coisas todas que dão imenso jeito
para o conforto e bem-estar do arguido ou do criminoso.
Resumindo e concluindo sem fulanizar: é forte suspeito da
prática de um crime grave? Então espera preso pelo julgamento. Foi condenado?
Cadeia até ao final da pena. Mas isso pode levar muito tempo? Então façam as
coisas mais rápidas. Porque a verdadeira vergonha da Justiça em Portugal não é
apenas o tratamento diferenciado que é dado aos cidadãos com mais ou menor
visibilidade e posses, é sobretudo a morosidade da mesma.
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