Afinal votei bem

Em Janeiro de 1991 votei pela primeira vez. Eram as eleições presidenciais onde concorriam Mário Soares e Basílio Horta. Ainda com pouca consciência política mas já com manifesta simpatia pelo PSD que nessas eleições não apresentou candidato próprio, se assim se pode dizer tendo em conta que nas presidenciais as candidaturas não são partidárias, votei em Mário Soares. Cavaco Silva na altura tinha dado sinais de proximidade a esta candidatura na medida em que o PSD não patrocinou qualquer outra, depois de um mandato presidencial muito tranquilo do ponto de vista institucional por parte de Mário Soares, contrastando com o que protagonizou no segundo, onde foi a face mais visível da oposição ao então governo social-democrata.
Passados uns meses aderi ao PSD, partido onde me encontro inscrito até hoje, com as quotas pagas, e do qual não pretendo mudar, porque não sendo a mesma coisa que ser do Benfica que se é para toda a vida, a verdade é que não gosto do mercantilismo partidário onde um dia são de uma cor e passado um tempo são de outra. Admito um dia poder não ser militante do PSD, por qualquer razão, não admito inscrever-me em outro dos já existentes ou a criar. Tenho razões ideológicas de fundo para ser do PSD e não apenas o gosto pela cor de laranja ou uma qualquer conveniência conforme acontece com alguns companheiros meus.
Serve isto para dizer que passados uns meses arrependi-me de ter votado em Mário Soares quando comecei a ver o seu comportamento de pouca colaboração institucional, participando na vida política do país como “força de bloqueio” conforme foi apelidado na altura por Cavaco Silva.
Soares era o rosto da oposição, numa altura em que poucos acreditavam nos méritos políticos de António Guterres que após a derrota de Jorge Sampaio nas legislativas de 1991, tomou conta do PS.
Vivi com este arrependimento até aos dias de hoje. Bolas, logo na primeira vez que vou votar faço asneira. Pensei: - Coisa de jovem que não pensa duas vezes no assunto e acaba por fazer disparate. Isto com a idade muda.
É verdade que em Outubro de 1991 votei bem e ajudei a dar a maioria absoluta a Cavaco Silva, mas o arrependimento conviveu comigo até hoje. Digo até hoje porque já não estou arrependido.
O candidato alternativo a Soares em 1991 era Basílio Horta, que hoje está no parlamento na bancada do PS. O mesmo que tinha concorrido com o fundador do socialismo português, com o qual foi bastante agreste durante a campanha eleitoral, coisa que já na altura me fez muita confusão e ajudou a decidir o sentido de voto. Ainda ontem vi Basílio, não o primo de Eça mas um dos fundadores do CDS, a defender a participação do Estado em sectores estratégicos da economia, presumo que se referia às golden-shares que a União Europeia há muito defende a sua extinção por manifesta ilegalidade. Confesso que vê-lo a aparecer na altura em que apareceu ao lado de Sócrates cheirou-me mais a conveniência do que a convicção e isso também ajudou a que o meu sentimento de arrependimento desaparecesse.
Hoje sinto-me mais tranquilo. Aos 19 anos de idade afinal não me enganei. Votei bem. É que antes votar em alguém com que não se concorda mas que é fiel e coerente aos seus princípio de vida e políticos, do que num candidato que troca a camisola conforme a conveniência e diz hoje coisas contrárias ao que antes defendeu. Ser do CDS mesmo nos primórdios do partido, não é a mesma coisa que ser hoje socialista, isto do ponto de vista ideológico.
Álvaro Cunhal, na minha opinião não foi um defensor da liberdade e defendeu regimes totalitários que assassinaram muita gente. Mas com ele sabíamos todos com o que podíamos contar. Mário Soares foi sim um defensor da liberdade e da democracia e goste-se ou não e eu não gosto muito, sabe-se igualmente com o que se conta.
Acredito que Basílio Horta já tenha lido O Conde de Abranhos do Eça. Não lhe fazia mal lê-lo de novo.

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